O RÁDIO
Logo cedinho da manhã, depois do
galo cantar, a primeira ocupação do meu saudoso pai Hilton era escancarar o
móvel grande da sala de estar. Lá estava, o possante rádio AM de válvulas, um pick up para disco de vinil com setenta
e oito rotações por minutos e, a novidade dos anos cinquenta era o disco Long Play e, finalmente, um armário onde
colocava os discos na ordem dos cantores e orquestras, para facilitar a
escolha.
Pelo
que se tem conhecimento, foi nos idos de 1920 o início das rádios, com o
aniversário do Centenário da Independência do Brasil e coube ao entusiasmado
Roquette Pinto, o primeiro a utilizar o sistema AM Rádio Sociedade, no correr
de 1923 e, já no ano seguinte inaugurou a Rádio Clube do Brasil.
Pois
bem, no rádio de Seu Hilton, ele esticava o dial para alcançar as emissoras
locais e também as grandes do sul do país, como rádios: Super Tupi, Nacional do
Rio, Globo, Record, Mayring Veiga, Jornal do Brasil dentre muitas outras rádios
AM.
Lembro-me agora, que a música sem letra nos
concede o direito à imaginação, principalmente, quando ouvimos e tentamos
escrever nossos sentimentos íntimos.! Tinha uma emissora de rádio, que meu pai
sintonizava diariamente, e eu da cama ouvia constritamente. Somente em tempos
recentes, é que aprendi que um violonista se esmerava em tocar “Abismo de Rosas” num solo de luxo, para
violão de difícil exibição.
Até
hoje, me comovo com os toques suaves e cadentes da música do grande Dilermando
Reis. No início, dedilhando como se fosse os acordes iniciais de uma noiva
caminhando lentamente ao altar, com uma bela rosa vermelha levada pela suave
mão, a altura dos seus seios, para meu coração bater mais forte e acelerado,
como a cobrar meu sentimento de pobre mortal, ante os formais acordes de
entrada musical!
A
música segue em ritmo de uma valsa dolente, em pequenas paradas, como a
cumprimentar as testemunhas presentes e familiares. E lá vai a noiva embalada e
sorrindo nos sonhos na busca da consagração perante seu homem amado.
Enquanto
o violão dedilha o que deseja e imagina, eu, nos teclados da internet me arvoro
do desejo na busca de desejar ser feliz nas frases mal feitas da ousadia.
O
solo musical vai despejando no ar, como se as pétalas de rosa pudessem alcançar
as nuvens e estrelas, enquanto sonho acordado no amor sem rumo de momentos de
pura incerteza. O único violão volta a manejar suas cordas para completar,
impecavelmente, o caminho do desejo solitário. Em dueto de cordas o violão
mostra copiosamente chorar como a esperar de alguém que não conhece. Ele mesmo,
se restabelece e caminha, alteando as notas para se ajoelhando ao solo frio,
suplicar um momento único de amor, o desejo.
Respiro
forte, entrelaço os dedos suados e sigo para os derradeiros acordes, no momento
lindo do abismo se encher com as rosas vermelhas e seu perfume inebriado
atravessando o tapete púrpuro da flagrância no seguro caminho do desejo!
Continuo
sem poder escrever. Só a imaginação é a vontade inebriada de ser feliz. O
abismo de rosas foi o caminho penoso, porém certo e determinado, de que somente
os amantes conseguem transpor.
MARCOS SOUTO MAIOR
Advogado e desembargador
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