FREIO DE ARRUMAÇÃO

BLOG DE WILLIAM SANTOS | 6/10/2012 08:18:00 PM | 0 comentários


O burro balançava o lombo para um lado e para o outro, pelo peso dos caçuás cheios de mantimentos vindos dos sítios e fazendas da redondeza. Era dia de feira livre semanal, onde o povo simples do mato se abastecia para a semana seguinte.
Os caçuás são cestas grandes e resistentes formadas por cipó, vime, taquara ou fasquia de bambu, jogadas no lombo das cavalgaduras para pendurar a carga de ambos os lados.
Seu João caminhava acompanhando, ao lado da montaria e, vez por outra, ajeitando a carga pesada que desalinhava no lombo do burro “Atrevido”, isto porque ele sempre se adiantava na passada e não podia ver uma burra no cio... Contudo, o chicote era apenas para evitar que o leal e trabalhador burrinho atravessasse a estrada de olho numa touceira de capim. O comando mesmo era feito no grito: “bora, “Atrevido” de uma figa, vamo que o sol já tá quente e preciso vender as coisa”!
A viagem que consumia umas três léguas entre trilhas e estradas carroçáveis chegava ao seu término. Mestre João se projetou ao lado do focinho do companheiro de trabalho e acariciou a cabeça suada do esforço. Em seguida, com as mãos nos quartos olhou para saber onde descarregar tudo que o sítio “São Benedito” produzira naquele final de semana. De pescoço esticado, parou um pouco para ouvir dois tocadores de embolada rimando em interessante desafio musical sertanejo.
Finalmente, com os dois caçuás no chão, a contagem das espigas de milho verde é confirmada, sendo a mercadoria esparramada no chão com a freguesia se apressando em apalpar cada espiga. O milho verdinho, recém colhido na roça, é levado para as respectivas casas a fim de fazer pamonha, canjica, mugunzá e o próprio milho verde cozido ou assado na brasa de fogareiro ou fogueira.
O preço bom para o vendedor decorreu da falta de chuva na região e a omissão dos governos federal e estaduais num ano de eleições municipais, onde a compra de votos corre frouxa...
Nosso herói abre exagerado sorriso com o sucesso do seu milho verde em véspera de safra, com uma mão de milho (são cinquenta espigas) pelo dobro do cobrado no ano passado. “É luxo, seu menino, ter milho verde bom nessa seca de lascar”!
Quando menos se espera, lá vem uma “marinete” buzinando danadamente, abarrotada de matutos em sua carroceria que se misturavam com verduras, farinha, carne seca e frutas da época trazidas para as improvisadas barracas da feita dominical.
Principalmente, em dia de feira livre, os caminhões e camionetes adaptadas fazem filas para chegar ao local de descer as mercadorias para as barracas de vendas.
O interessante de tudo é que um motorista aloprado continuou acelerando o motor e deu uma rápida arrancada, em seguida, com um freio brusco que balançou e misturou pessoas e mercadorias. É o famoso ‘freio de arrumação” onde as coisas se ajustam, quando já não há mais clima para entendimento.
E vejamos que em muitos lugares do nosso país, tem muito burro de paletó e gravata lhe faltando mesmo um “freio de arrumação”, para que o serviço público não continue navegando em meio a muitos escândalos sem solução.













MARCOS SOUTO MAIOR 
Advogado e desembargador aposentado


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