O TROCO

BLOG DE WILLIAM SANTOS | 12/11/2012 10:48:00 AM | 0 comentários


As cidades, antigamente, eram abastecidas de alimentos pelos mercados públicos, também conhecidos por feiras livres, onde um determinado dia era escolhido para os produtores trazerem suas mercadorias na praça. Afora o dia da feira, funcionavam as mercearias que trabalhavam todos os dias.
Geralmente, as lojas eram sempre um galpão comprido, localizado na rua principal da cidade e próximo do local da feira, com portas altas de duas bandas, para facilitar a abertura e melhor visibilidade. Balcão único que tomava de lado a lado e o atendimento feito pelo próprio dono do venda e seus familiares. Um empregado de fora apenas para despachar os pedidos pesados. Do lado de dentro do balcão, os sacos de feijão, arroz, açúcar, café em pó, mantas de carne de charque salgada e, barrica de bacalhau salgado, este hoje sendo alimento dos ricos. Demais produtos eram estocados, em meio a uma balança com dois pratos de metais: um colocava o produto e outro o peso.
Como grande parte das famílias dependia do salário mensal, as “vendas”, como assim também eram denominadas, estipulavam uma caderneta onde se anotava tudo o que era adquirido, para quitação no final do mês. A confiança era absoluta entre vendedor e comprador, e a anotação do produto e o preço eram feitas, apenas, pelo dono da loja. Qualquer pessoa da família podia pegar tudo o que precisasse, e até mesmo os serviçais. Na verdade a caderneta de anotações de consumo era simplesmente um caderno de capa dura sem nenhuma validade, senão a confiança absoluta de ambas as partes.
Seu Zé, mãe mandou buscar uma quarta de manteiga, meio quilo de charque, uma barra de sabão, uma garrafa de querosene, cinco velas, uma caixa de fósforo e um pacote de macarrão. Sim, também que jogasse no pule do jogo do bicho no milhar 0716. Foi à requisição verbal feita por Zé Antônio, filho de Antônio da Coletoria. Aliás, apostar no jogo do bicho não tinha agrado não, era em dinheiro vivo!
Esse foi o passado que se transformou nos mercadinhos, vindo depois os supermercados e hoje os hiper da vida.
Lembro-me agora que, ao final de cada mês, o responsável, pelo débito da caderneta de compras mandava somar e puxava o dinheiro do bolso para pagar. O dinheiro era repassado ao maior, porque sempre tinha troco em moedas para devolver aos fregueses.
Hoje, no serviço público, mesmo com os rigores e a precisão da internet as licitações são dirigidas com apadrinhamentos pelo poder que manipula com valores superfaturados, sendo o restante amealhado pelo respectivo reizinho do regime republicano brasileiro.
Apesar da boa e invejável remuneração pessoal, e com descomedida mordomia oficial, os reis da democracia desses tempos, querem mais do que o troco devido.
Em palavras mais simples, nos dias atuais, o “troco” é simplesmente o que sobra do que se pagou, a mais, pelos serviços públicos contratados em licitação viciada e irregular. E o povo abandonado e sofrido do nordeste dará o seu troco nas eleições de 2014.

MARCOS SOUTO MAIOR 
Advogado e desembargador aposentado

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