INTIMIDADE
As coisas eram complicadas demais para a rapaziada de décadas
passadas encostar-se a uma menina bonita e de corpo escultural. Sim,
embora sob o seu corpo fosse coberto desde o sutiã, passando pela
calcinha e, ainda por cima vinham outras indumentárias íntimas, a
depender do corpo da jovem, a curiosidade era grande.
Se ela
fosse gordinha, aí seriam indispensáveis instrumentos que mais se
pareciam com equipamentos de soldados em guerra, ou jogadores do futebol
americano. Tudo era apertado ao máximo desde a gordurinha da barriga,
do bumbum e dos peitos. O sutiã era o primeiro a ser armado, também
chamado de “califon”, em seguida era implantado o espartilho, depois
vinha o corpete e, mais abaixo as cintas-ligas, ou mesmo, o caleçon uma
espécie de calçinhas, de vários tipos, que sustentavam as ligas e estas,
as meias compridas.
Para as magrelas, aí o enchimento era
grande, vindo a tradicional combinação, depois a saia armada com muita
goma e, finalmente, anágua envolvida na cola branca da goma que deixava a
saia rodada, parecida com armação dos vestidos das baianas de escolas
de samba.
Tinha até uma vizinha minha que era tão magra, mas tão
esquelética que se diziam, na época, que ela tinha uma bunda de algodão
bem amarrado na traseira, sob o respeito da garotada que olhava
detidamente, comentando às escondidas, sem menor perigo de qualquer
marmanjo se encostar ou catucá-la. O respeito era total!
As
famílias constituídas eram consideradas em todos os sentidos, havendo
uma proteção, principalmente para as meninas, que eram tidas como
frágeis, aí a complexidade para manter um bom papo. Aliás, se utilizava o
nome composto de “menina de família” como se houvessem outras que
nasceram em chocadeiras...
Tento explicar: as jovens
rotuladas “de família” eram mantidas com aparato exagerado, sendo
originárias de famílias abastadas, ostentando pomposos sobrenomes e,
tradicionalmente, respeitadas pelo poderio econômico, financeiro,
religioso e político.
Naqueles tempos sinais de riquezas
seria possuir um carrão importado, porque não havia veículos fabricados
no nosso país; casa no centro da cidade e outra em praia nordestina, em
tempo da tradicional temporada de veraneio; andar bem vestido e estudar
em colégio particular, de preferência de padres, irmãos maristas ou
pastores evangélicos.
Intimidade era atitude absolutamente
proibida pelas famílias, e uma simples piscada de olho, era motivo para
se considerar namorico de primeira viagem!
Na praça central da
cidade, passávamos à noite para saber onde haveria festa de quinze anos
ou “assustados”, festinhas ao som de hifi, marcando o ritmo da dança,
com as meninas “botando macaquinho”. Tal cuidado consistia nas meninas
dançarem a
uma certa distância e, por segurança, apertava
suavemente a sua mão direita com a do rapaz e a outra mão apoiava no
ombro do jovem, para evitar qualquer tentativa de colar os corpos.
Um amigo de juventude me fazia queixas sobre o espaço imposto por
sua namorada, com uma distância dos corpos dando para atravessar com um
patinete.
“Amigo, quando tento me encostar em Letícia eu só
sinto o rangido das saias que ela usa, umas por cima das outras”,
protestou Marnilson.
Namorar em casa significava
um profundo processo seletivo familiar, para conhecer o histórico do
cara, com hora para iniciar e terminando as vinte e uma horas. Entrar em
casa, nem falar, a ordem era conversar no portão da casa...
O
jeitinho brasileiro de driblar a vigilância levava muitos jovens a pedir
licença para ir ao banheiro, o que significava segura intimidade no
namoro!
Afinal, a intimidade nunca foi fácil para os jovens da
minha época, entretanto, tudo era resolvido pela mais viva imaginação.
Advogado e desembargador aposentado
Category:
0 comentários